O recente episódio envolvendo o trote de alunos de um curso de Medicina no interior do Estado de São Paulo ilustra a tese de que a vítima de hoje será o agressor de amanhã. O mecanismo que leva uma pessoa a aceitar ser tratada daquela forma humilhante, como mostrada na TV, é o mesmo que a levará depois a infligir o mesmo tratamento aos futuros calouros. Negar-se a se submeter a estas práticas de constrangimento e agressão – hoje conhecida como bullyng - significa afirmar para outros e para si, sobretudo, que não se tolerará esta prática abusiva. Quem se submete, tacitamente, aceita esta como uma prática válida a ser infligida não apenas contra si, mas contra os demais também. Tratando-se, daí por diante, apenas uma questão de oportunidade o agredido tornar-se o agressor.
Assim não devemos encarar essas pessoas apenas como vítimas. Elas têm em si o potencial dos futuros agressores. E se não devem ser tratadas como réus neste episódio, devem ser acompanhadas por especialistas para se prevenir futuros ímpetos agressivos.
Transpondo essa observação para o ambiente macro das relações sociais podemos compreender como esse mecamismo se desenvolve em outros ambientes: a criança mal tratada na infância se tornará o adulto agressivo de amanhã; o abusado contumaz, o abusador; o corrompido, o corruptor.
No caso da criança essa violência não tem nome, pois se trata de um inocente, incapaz de se defender, até mesmo mentalmente, das agressões sofridas. Ela consentirá nesse comportamento que com o tempo passará a considerar “normal” e mais tarde, quando adulto, tentará replicá-lo nas suas relações interpessoais. Afinal, ela foi educada assim, a ponto de causar nela perplexidade a reação repressiva da sociedade, que pode considerar esse comportamento como apenas um comportamento anti-social ou até mesmo criminoso, tudo na dependência da intensidade e da natureza da agressão sofrida na infância.
Isso, contudo, não quer dizer que toda vítima de uma agressão – considerada esta em sentido amplo, não apenas física - se tornará um agressor. Essa situação, me parece, é mais plausível naqueles casos de uma agressão que se repete ao longo do tempo, levando à ruptura da resistência mental do agredido, que passa a consentir na agressão, ou quando, já de imediato, seja por uma circunstância ou outra – entre elas sobreleva, sobretudo, a intimidação da exclusão do grupo, como no caso dos estudantes de Medicina acima - há o consentimento tácito da vítima à agressão sofrida.
Cabe, pois, à escola e às Autoridades – desde as de Segurança Pública até as de Saúde – darem a devida atenção para esses casos, afim de prevenir os danos sociais e psicológicos passíveis de resultarem dessas situações de abusos, sobretudo quando os agredidos são crianças, cujo potencial de dano a longo prazo são incalculáveis.
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