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BOLSONARO E CENTRÃO, CASAMENTO DE CONVENIÊNCIA COM DATA PARA ACABAR

A eleição do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, do PP, com apoio do governo – e bota apoio nisso! – formaliza definitivamente o casamento de Jair Bolsonaro com o Centrão.

A questão agora é saber quanto tempo durará esse casamento?

É sabido que o Centrão congrega uma coleção de pequenos partidos cujos interesses primordiais não são outros senão o de ter acesso às verbas do orçamento e a cargos, interessando pouco a ideologia de quem está no poder. Tem sido assim desde a constituinte de 1988 quando o bloco foi formado. Todos os governos que vieram depois tiveram de passar pelo ritual do beija-mão do Centrão para governar – quem não o fez, como Collor e Dilma, bem sabemos o que aconteceu -, inaugurando aquilo que depois ficou conhecido como o presidencialismo de coalizão. Presidencialismo que Bolsonaro, durante a campanha, jurou que não ia praticar, já que se elegeu pregando o vago conceito de uma nova política. Quando, contudo, seus arroubos autoritários foram devidamente contidos pelo sistema de freios e contrapesos da República, representados, de um lado, pelo STF e seu inquérito sobre as fake News e atos antidemocráticos e, por outro, pela Câmara dos Deputados, cujo então presidente Rodrigo Maia revelou-se uma voz sensata e moderada em meio ao caos que é o governo Bolsonaro - ainda que Maia tenha sentado sobre mais de 60 pedidos de impeachment durante sua gestão, há que se registrar que esses pedidos nunca foram arquivados, servindo essa manobra de estratégia também para conter o presidente – Bolsonaro começou a se aproximar do Centrão para barrar um eventual processo de impeachment, por crime de responsabilidade, ou até mesmo por crime comum, dado que a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor do seu filho, Flávio Bolsonaro, na ALERJ, também exerceu um papel dissuasório significativo.

O bloco, que aglutina mais de 200 deputados, é imprescindível para barrar qualquer tentativa de impeachment, dado que o número de deputados necessários para autorizar que o Senado Federal processe o presidente, por crime de responsabilidade, ou o STF, por crime comum, é de 2/3 dos deputados, ou seja, 342 votos. Considerando que são 513 deputados, 342 votos jamais serão atingidos se o Centrão – ou ao menos parte dos deputados que o compõe – não referendar o processo – 513 – 200 = 313 deputados. Assim, Bolsonaro tendo o Centrão do seu lado, pode ficar tranquilo: nenhum processo de impeachment ou pedido de autorização para processá-lo por crime comum irá prosperar.

O problema é o custo disso.

Especula-se que para garantir a eleição de Arthur Lira, Bolsonaro tenha prometido verbas do orçamento da União no montante de 3 bilhões, fora outros tantos cargos no governo, especialmente os de Ministro de Estado. Sabemos, contudo, que isso é apenas o começo. Para cada votação importante, agora, no Plenário, o governo terá de oferecer mais. A questão é: até quando?

Bolsonaro já provou que de bobo não tem nada. Ele pode ser bronco, ignorante, racista, homofóbico e violento, mas não é burro. Bolsonaro sabe que esse acordo tem data para acabar e essa data passa pela primeira denúncia de corrupção que houver no governo. Com o loteamento de cargos que começa agora a ser feito com o Centrão, cuja fama não é, nem nunca foi, de ética na política, isso não vai demorar muito. Ao tentar se descolar do Centrão, como sempre faz quando os odores da corrupção começam a cercá-lo – foi assim com o laranjal do PSL, Bebbiano, Bivar e outros aliados, mesmo os de primeira hora – Bolsonaro poderá ser emparedado pelo Centrão – este, ao menos, vai tentar. Será o pretexto perfeito para Bolsonaro denunciar o acordo que fez com o bloco, vitimizando-se perante a opinião pública, sobretudo entre seus apoiadores, alegando que com esse Congresso não dá pra governar, que é a velha política tentando frustrar seu projeto de governo – cujo teor ninguém sabe até hoje qual seja, se não a de governar como um autocrata -, arregimentando de novo suas milícias contra o Congresso e o STF.

Ele sabe que se descolar do Centrão ele cai por qualquer um dos 60 pedidos de impeachment que lá já estão; se ele ficar com o Centrão, ele cai igualmente, pela pecha de governo corrupto, fazendo que perca definitivamente apoio popular. Então só haverá um caminho para Bolsonaro: dar o golpe.

É claro, que no meio do caminho tem uma eleição presidencial. Esse fator, no entanto, poderá só antecipar ou retardar a medida extrema. Tudo dependerá como se portarão os “bocas de jacaré” - como ficaram conhecidos os propineiros durante as apurações da Lava Jato. Se a fome dessas bocas for demais e os órgãos de investigação tiverem vontade de apurar, fazendo vir à tona os fatos delituosos, o golpe poderá ser antecipado para antes de 2022. Se a fome for moderada e os órgãos de investigação forem camaradas, o golpe poderá ser adiado, desde que o cenário das eleições seja favorável a Bolsonaro e este se veja com chances reais de ganhar.

Urge, pois, que as instituições – ou o que ainda resta delas – fiquem atentas, pois a temperatura do risco de quebra da ordem institucional, com a ida do Centrão para o governo, subiu drasticamente. A questão, me parece, já não é mais “se”, mas “quando”, havendo vários sinais que já vem sendo dado pelo governo não é de hoje: liberação da importação de armas, afrouxamento no controle das munições, projeto de lei para unificar as polícias dos estados no âmbito federal. Agora mesmo, no leilão da rede 5G, o governo exige, para sua concessão às teles, como contrapartida, uma rede exclusiva para uso do governo federal.

Não esqueçamos que Bolsonaro, antes de mais nada, é um militar. Um mal militar, é verdade, mas um militar. Sua formação é toda baseada na filosofia do militarismo, qual seja, a de ver inimigo em toda parte e de fazer o emprego maciço de estratégias de combate no seu dia a dia, tais como a desinformação, a ameaça, o culto à violência e às armas e, agora, a aspiração de ter um canal de comunicação exclusivo com seu público.

Uma rede de comunicação privativa do presidente que o ponha em contato com suas milícias de apoiadores e as forças policiais dos estados, especialmente do baixo oficialato, seria uma arma poderosíssima em suas mãos, com a qual convém não se brincar. Nesse ponto, cabe às Forças Armadas também se posicionarem. O problema é o comprometimento delas quando passam a integrar o governo, assim como o próprio Centrão, recebendo do governo o que mais desejam: dinheiro e poder, mal sabendo que, em assim fazendo, comprometem o que de mais precioso elas têm: a boa fama, a moral e o poder das simbologias. Bolsonaro bem sabe disso, ao tentar garrotear esses dois importantes atores ao seu projeto de poder. Se não o apoiarem, ele conta o que sabe sobre eles.

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