Assistimos esta semana ao julgamento da chapa PT/PMDB que levou, em 2014, a reeleição da Presidente Dilma Rousseff e Michel Temer, como seu Vice. O julgamento que há um ano atrás parecia ser a opção caso Dilma não caísse, acabou se tornando um estorvo para o Governo que assumiu depois da queda da Presidente. Até uma esdrúxula separação de contas das campanhas da Presidente Dilma e do Vice Michel Temer foi pedida, para tentar salvar um em caso de condenação do outro. No caso, da quase certa condenação de Dilma, como da quase certeza absolvição de Temer.
Capitaneando todo esse processo a figura mais controversa da Republica, o Ministro do STF Gilmar Mendes. Aquele que circula impávido pelos círculos do poder, como a mais deslavada sem-cerimônia.
Pode isso, Arnaldo? perguntaria um escandalizado Galvão Bueno, diante do show de horrores que essa figura controversa protagoniza, desde relações próximos com o réu desse processo, o Presidente Michel Temer, até sua descarada preferência pelas figuras proeminentes do PSDB.
Pois bem, foi justamente esta figura, que no passado defendeu com unhas e dentes a abertura de investigação contra a Chapa vencedora da eleição de 2014 e que esta semana fez todos os esforços para minimizar as razões do voto que acolheu a denúncia do PSDB, no TSE. Razões muito bem pinçadas pelo Relator do caso, Ministro Herman Benjamim, a ver se confrontado com suas próprias palavras, em passado pouco distante – 2015 –, o Ministro Gilmar tivesse um surto de decência e admitisse se ater ao fatos. Mas o cinismo não tem limites e, com a maior cara de pau, o ilustre Ministro Gilmar ignorou seu passado, como outrora outro Presidente já dissera: esqueçam o que eu escrevi.
Como é difícil ser coerente, não é? E como é difícil manter a sanidade nesse turbilhão em que se transformou o país depois que as apurações da Lava Jato literalmente puseram a nu os homens públicos desta nação.
Assim, o Ministro, na condição de Presidente da Corte Eleitoral, proferiu o voto de minerva, desempatando a votação que estava em 3 a 3, sendo três votos a favor da cassação – Benjamin, Fux e Rosa Webber – e três contrários – Napoleão Maia, mais os dois recentes indicados pelo Governo Dilma/Temer, Admar Gonzaga, advogado de Dilma em 2010 e Tarcísio Carvalho Neto. (Em outras circunstâncias, a panelas cantariam, mas isso já é assunto para uma outra ocasião).
Desse circo todo, a única coisa que eu não entendi é o que a defesa da ex-Presidente Dilma Rousseff estava fazendo lá? Defendendo o seu arqui-inimigo, Michel Temer?
Pois foi justamente este o resultado prático da sua atuação nos autos: defender aquele que lhe passou uma rasteira.
É claro, dirão os esclarecidos, ela precisava preservar seus direitos políticos. Mas me pergunto? Isso vale o sacrifício de se alinhar na defesa daquele que lhe apunhalou pelas costas?
Não saberia dizer, mas imagino que no mínimo foi um tremendo constrangimento do PT estar a pugnar ao mesmo lado do traíra.
A que ponto as circunstâncias políticas desse país estão levando às pessoas e às instituições. Unir dois inimigos declarados, na defesa de um mandato obtido mediante um golpe branco? O que se queria, afinal, se provar com isso? Não seria mais inteligente da Presidente Dilma – e essa parece não lhe é a maior qualidade – ter se retirado do processo e deixar o coisa ruim pelejar sozinho? Em amor aos princípios, penso que sim, mas onde estão os princípios quando a real politik parece ter tomado conta do país?
Como num recente editorial do Jornal O Globo manifestou, estamos mesmo vivendo uma situação de realismo mágico.
Não menos contraditória deve ter sido a postura do PSDB que iniciou a ação e depois tornou-se aliado do Governo. É claro que a contrariedade foi mitigada pelas denúncias dos últimos dias que enfraqueceram sobremodo o Governo de Michel Temer, tanto que o PSDB ensaia uma saída do Governo, mas de qualquer sorte, o partido aliado leva à cabo uma ação contra o Governo que integra.
De outra parte, a postura do Ministro Gilmar Mendes, ignorando solenemente às razões do seu voto no passado, ao dizer que a abertura do processo não era necesseriamente para perpetrar uma cassação. E que o país precisa de estabilidade. Mas a que custo, cara pálida? A custa de ignorar solenemente os fatos da investigação? Até que ponto a política deve se imiscuir na Justiça? Para o Ministro Gilmar, parece não haver limites, e o pior de tudo, é usar argumentos jurídicos para a defesa de uma ideologia.
Não será por outro motivo que, em boa hora, a defesa do Presidente Lula tem usado do argumento de que o que se está praticando contra o Presidente é lawfare, um conceito jurídico novo que nada mais é do que a utilização de recursos jurídicos para fins de perseguição política, com a conivência da imprensa que não raro divulga fatos contra o investigado sem qualquer base fática ou provas, desconstruindo a sua imagem.
Já dizia Rui Barborsa que a pior da ditaduras era a do Judiciário, pois a quem se socorrer quando injustiças são perpetradas? Se não puder contarmos com um judiciário isento e distante das questões da política comezinha desse país, corremos o sério risco de cairmos nessa ditadura branca que a sabedoria popular há muito tempo consagrou entre nós: manda quem pode, obedece quem precisa. Oxalá, tal fato não se confirme e possamos contar com um Judiciário efetivamente isento e técnico, pois de outra forma essa ditadura branca pode levar à descrença das instituições e à revolta popular.
Комментарии